"O Senado me envergonha"
Alexandre Guimarães, 38 anos, é funcionário concursado do Senado desde 2004. Chefe da consultoria legislativa, recebe mais de 20 000 reais por mês, entre salário e vários benefícios. Mesmo bem remunerado, pensa em deixar o emprego. Ele conta que não convive direito com os truques armados pelos parlamentares e funcionários da Casa.
Como você chegou ao Senado?
Prestei concurso em 2002 e entrei dois anos depois de uma maneira estranha, no que ficou conhecido como "o concurso dos 40 do Pedro Costa" (Pedro Pereira da Silva Costa é filho de um jornalista maranhense e trabalha com Sarney desde a Presidência da República). Eu fui o 19º colocado num concurso para preencher apenas três vagas. De repente, chamaram quarenta. Tudo isso, soube depois, apenas para que um amigo do presidente Sarney conseguisse um emprego no Senado.
Havia necessidade de contratar tanta gente nesse concurso?
No começo, não tinha nem mesa para trabalhar. Era constrangedor. Eu ia lá todo dia, assinava o ponto, ficava enrolando um pouco e voltava para casa sem fazer nada.
O senhor já foi beneficiado por algum desses esquemas que vêm sendo denunciados?
Eu consegui autorização do Senado para ultrapassar o limite legal de endividamento pelo crédito consignado. Antes de passar no concurso, também trabalhei com o senador Gilvam Borges (PMDB), no Amapá, até descobrir que meu salário era pago pelo Senado, embora trabalhasse em uma rádio do senador. Quando soube, saí de lá.
Os concursos do Senado são disputados por milhares de pessoas...
Não vou negar que ganho bem, mas isso também acaba sendo constrangedor. Para começo de conversa, são três ou quatro contracheques por mês. O meu vencimento básico é 6.411 reais. Mas há as horas extras, gratificações, comissões e outros penduricalhos. Somando tudo, dá um total de mais de 23.000 reais. Em alguns meses, o salário bruto ultrapassa o teto do funcionalismo público. (Alexandre recebeu neste mês 32.364,62 reais, incluindo a primeira parcela do 13º salário.) É um jeito que encontraram de pagar mais aos servidores, mas de maneira torta. Vim da iniciativa privada e nunca me acostumei com isso.
Você tem orgulho de ser funcionário do Senado?
Atualmente tenho vergonha. Tirei férias no início do mês e fui visitar uns parentes. Foi duro chegar para a família e tentar explicar a todo mundo que eu sou diferente dessa imagem do Senado.
Hora de fazera a faxina
O Senado Federal tem em seus quadros motoristas, ascensoristas e seguranças com salários superiores ao do presidente da República. Apesar da crise que abalou o mundo, lá não existem vestígios de desemprego.
Mesmo com mais de 8 000 funcionários, há sempre uma vaga disponível para um parente, amigo ou correligionário dos parlamentares. O Senado também é invejado pelo tratamento que dá a seus servidores. Sua direção tem carta branca para aumentar os próprios vencimentos e se conceder privilégios, como promoções, plano de saúde vitalício e pagamento de horas extras, inclusive para quem não trabalha.
E o mais impressionante: tudo pode ser feito na surdina, completamente às escondidas, de modo a manter as irregularidades longe dos olhos dos eleitores. Há cinco meses, o Senado Federal está se submetendo a um processo de implosão com revelações de casos de nepotismo, tráfico de influência, mordomias e corrupção envolvendo parlamentares e funcionários. Restou evidente que, há anos, o templo da democracia abriga um gigantesco mausoléu de más práticas políticas que não condizem mais com a realidade de um país que mira um ponto mais alto na escala de civilidade. Além dos copeiros e ascensoristas, o Senado precisa urgentemente contratar um faxineiro para limpar as sujeiras da instituição.
O presidente do Congresso não parece ter saúde nem disposição para a missão, da qual declinou explicitamente em um discurso ao plenário. Desde que assumiu o cargo, em fevereiro, José Sarney tem sido diariamente confrontado com as mais variadas evidências de irregularidades, a maioria delas desencavada pelos repórteres da sucursal de Brasília do jornal O Estado de S. Paulo.
Aos 79 anos, o ex-presidente da República está refém de suas próprias criações. A mais assustadora delas, o ex-diretor-geral Agaciel Maia, enriqueceu no posto chefiando uma administração paralela, clandestina, que usava para favorecer parentes, amigos seus e de parlamentares. Os atos clandestinos beneficiaram um mordomo, que recebia 12 000 reais de salário mensal do Senado, mas, por motivos óbvios, não trabalha lá, e sim na casa de Roseana Sarney, filha do senador Sarney.
Por meios clandestinos também foi beneficiado outro membro do clã Sarney, João Fernando Gonçalves, neto do ex-presidente da República. Por fim, O Estado de S. Paulo revelou que José Adriano Sarney, também neto do senador, conseguiu uma autorização para negociar empréstimos consignados dentro do Senado. Segundo o rapaz, um economista de 29 anos de idade, sua empresa fatura perto de 5 milhões de reais ao ano.
Político há mais tempo em atividade no país, Sarney entronizou-se agora como símbolo do patrimonialismo, coronelismo e clientelismo que dominam a vida pública brasileira desde tempos imemoriais. Isso é justo com o velho patriarca, ex-presidente da República, o primeiro da era pós-ditadura militar, um homem afável e de vasta cultura, contrastante com a planície ágrafa que o cerca? Em política não existe justiça, mas perdedores e ganhadores. Os demais senadores, entre eles muitos que fazem a mesma coisa que Sarney, estão conseguindo que ele carregue sozinho nos ombros toda a culpa pelas escabrosas revelações das últimas semanas.
Não por injustiça, mas por ver nele um perdedor do jogo político pré-eleição presidencial de 2010. Na semana passada, diante da pressão provocada pelas novas denúncias, Sarney criou o Portal da Transparência, com todos os dados de compras, nomeações e gastos do Senado. Os dados mostram, entre outras coisas, que o presidente tem uma legião de 120 funcionários à sua disposição. São ocupantes de cargos que estão subordinados diretamente a ele, que escolhe quem nomear e quando demitir. Entre eles há familiares, assessores que cuidam dos escritórios políticos de Sarney no Maranhão e no Amapá, administradores do Memorial José Sarney, em São Luís, parentes de lobistas, de magistrados e de correligionários, como a mulher e a filha do ex-senador Francisco Escórcio, um quebra-galho do grupo político do presidente do Senado, que já foi acusado de espionar senadores adversários durante o processo de cassação de Renan Calheiros
Memórias do extermínio
As sangrentas lembranças da guerrilha do Araguaia, o controvertido combate entre militantes do PCdoB e oficiais do Exército nas selvas do Pará, no auge da ditadura, insistem em atormentar a memória do país.
Transcorridos 35 anos, muito se conhece e pouco se admite sobre esse triste episódio. Sabe-se agora que o Exército perseguiu e executou os guerrilheiros, mesmo quando eles já não ofereciam mais nenhum perigo aos militares. As Forças Armadas, porém, negam oficialmente até hoje a existência dessa campanha de extermínio, ignorando o direito dos familiares dos guerrilheiros de saber a verdade sobre o que se passou naqueles tempos sombrios.
Na semana passada, o oficial aposentado do Exército Sebastião Curió Rodrigues de Moura, o major Curió, um dos militares responsáveis pela caça na selva, admitiu, em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo, que as Forças Armadas executaram ao menos 41 guerrilheiros. É a primeira vez que um oficial do Exército confirma a matança. O depoimento de Curió joga luz nas circunstâncias em que se deram as execuções e as torturas dos militantes, mas ainda não esclarece por completo a história de cada um dos assassinatos.
VEJA entrevistou um militar que integrou a equipe de Curió - e participou da execução de ao menos três guerrilheiros. Esse experiente militar, que pertencia ao quadro de inteligência das Forças Armadas e tinha treinamento em combate na selva, aceitou contar em detalhes o que fez, contanto que seu nome permanecesse no anonimato.
Até hoje, nem mesmo sua família sabe que ele participou da caça aos guerrilheiros. Ele chegou ao Pará para participar da Operação Marajoara, a última etapa de combate à guerrilha. "A ordem era não deixar ninguém sair de lá vivo", rememora o militar. "Era uma missão, e cumprimos o que foi determinado." Recorrendo a uma identidade falsa, o militar virou funcionário público em Marabá, cidade próxima à região do combate, e se infiltrou junto à população civil para obter informações sobre a guerrilha. Tempos depois, ele passou a trabalhar na "Casa Azul", um prédio do governo localizado nos arredores de Marabá, onde o Exército mantinha presos e torturava os guerrilheiros capturados.
A ordem, lembra o militar, era extrair o máximo de informações dos presos e, quase sempre, por meio de torturas. Depois, assassiná-los. Tudo feito clandestinamente. O militar entrevistado foi um dos algozes do cearense Antônio Teodoro de Castro, estudante universitário de 28 anos conhecido como "Raul".
Ele conta que presenciou o interrogatório do estudante: "Ele tinha fome, vestia farrapos e estava amarelo, parecia ter malária. Nem precisamos bater para que ele falasse e dissesse tudo o que sabia".
Mesmo desarmado, famélico e doente, mesmo depois de contar tudo o que os oficiais queriam, Raul não foi poupado. Logo chegou a ordem: eles deveriam levá-lo para fazer um "reconhecimento". Reconhecimento, no código elaborado pelo Exército, era a senha para matar. Curió e seus homens, entre eles o militar entrevistado por VEJA, embarcaram Raul e outro guerrilheiro, o estudante gaúcho Cilon da Cunha Brun, de 28 anos, conhecido como "Simão", num helicóptero da Força Aérea.
Heráclito Fortes divulga 663 atos secretos, mas esconde outros 737, inclusive aqueles em que aprovou gastos de R$ 700 mil do Senado
O Senado Federal tem um dos mais altos orçamentos da República. Em 2008, a Casa consumiu dos cofres públicos - ou seja, do dinheiro de impostos pagos pelos brasileiros - R$ 2,7 bilhões. Só em salários e demais proventos para os dez mil funcionários foram cerca de R$ 2 bilhões.
Considerando-se que esse mar de recursos é gasto para justificar o trabalho dos 81 senadores, cada "excelência" custa ao contribuinte R$ 33 milhões ao ano. Mais grave é que não há a mínima transparência no uso desse dinheiro. No auge da crise que está sacudindo a Casa, foi revelada a existência de atos secretos para beneficiar parentes e gerar benefícios.
São decisões da Mesa Diretora que passam ao largo dos registros oficiais. Diante da denúncia sobre favorecimentos e mais de 250 nomeações irregulares, o primeiro secretário, Heráclito Fortes (DEM-PI), providenciou, em tempo recorde, a criação de uma comissão de sindicância. "Vamos ter todo o cuidado e a rigidez no sentido de apurar e punir os culpados", garantiu.
Com uma agilidade de fazer inveja à contagem de votos na eleição do Irã, a comissão distribuiu um relatório com 663 atos secretos, envolvendo 37 senadores. Tudo indicava que o Senado finalmente havia se rendido à necessidade de jogar luz sobre seus atos. Mas não foi dessa vez. O resultado é tão confiável quanto o do pleito iraniano. Diretores da Casa informaram à ISTOÉ que houve uma providencial triagem na divulgação dos atos secretos, cujo total chegaria a 1.400.
Heráclito teria divulgado apenas os atos administrativos. Entre as outras decisões, haveria despesas de R$ 700 mil autorizadas por ele mesmo entre 2005 e 2006, quando presidia o Grupo Brasileiro de União Interparlamentar. Portanto, Heráclito administrou uma meia transparência e torna-se, agora, um protagonista no escândalo. Heráclito nega que a lista de atos secretos seja maior do que a divulgada. "isso é uma molecagem, não assinei nenhum ato secreto. está cheio de casca de banana por aí", disse.
Na verdade, não interessa às "nobres excelências" abrir a caixa-preta do Senado. Afinal, a bilionária estrutura da Casa foi montada justamente para beneficiálos. Em 2008, por exemplo, os gastos com passagens aéreas somaram R$ 19 milhões, fortuna capaz de financiar várias voltas ao mundo. As diárias no País e no Exterior totalizaram R$ 1,3 milhão.
Os Amigos Sumiram
Senadores, agora, querem omitir relação com Agaciel Maia, mas ex-diretor ameaça contar tudo em delação premiada
Na segunda-feira 22, o senador Arthur Virgílio (PMDB-AM) preparava-se para iniciar um discurso na tribuna do Senado, em que acusaria de chantagista o exdiretor- geral Agaciel da Silva Maia. Agitado como sempre, convocou o presidente da Casa, José Sarney (PMDB-AP), para ouvi-lo. Ele soubera, dias antes, que Agaciel tinha em seu poder munição suficiente para bombardear senadores maculados pelos atos secretos.
Numa tentativa de se antecipar a futuras revelações que poderiam constrangê-lo, Virgílio levou ao plenário duas histórias nas quais houve participação direta de Agaciel em seu benefício. Só que acabou dando um tiro ainda mais certeiro no próprio pé. Conforme apurou ISTOÉ com altos funcionários da Casa, Virgílio abusou do gestual, mas escamoteou a verdade.
Da tribuna, o senador contou que, durante uma viagem a Paris, em 2003, com a família, ao tentar fazer uma compra identificou um problema com seu cartão de crédito. Ele foi rejeitado. De acordo com sua versão, um amigo conterrâneo e funcionário do Senado foi acionado para resolver o problema. Mas não foi bem o que aconteceu. Quem Virgílio procurou pedindo socorro foi o próprio Agaciel. Para isso, fez o contato por intermédio do amigo Carlos Homero Vieira Nina, hoje lotado em seu gabinete.
Homero telefonou para Agaciel numa manhã de domingo e pediu encarecidamente que o ajudasse. Foi taxativo: era um pedido urgente de Arthur Virgílio. Na conversa, Agaciel ponderou que seria impossível, pois era um domingo. Mas, diante da insistência do assessor de Virgílio, o ex-diretor telefonou para o gerente do banco e pediu que fizesse uma transferência de sua própria conta poupança no valor de US$ 10 mil para a conta do senador. Assim o cartão de crédito foi liberado. O fato foi confirmado à ISTOÉ por pessoas próximas ao exdiretor- geral. Com amigos, Agaciel comentou que esse dinheiro até hoje não lhe foi ressarcido.
Principal personagem da operação que salvou a passagem de Virgílio por Paris, Homero é um dileto amigo do senador. Prova disso é que empregou no gabinete parlamentar de Virgílio seus filhos Guarani Alves Nina, Tomas Alves Nina e Carlos Alberto Nina Neto. O último mora no Exterior, mas não deixa de receber salário. Há quem diga que a súbita fúria de Virgílio contra Agaciel estaria relacionada a outro fato que ele preferiu não contar em público: a exoneração do Instituto Legislativo Brasileiro (ILB) de Vânia Maione, esposa de Homero. Ela foi substituída por Carlos Roberto Stuckert, a mando de Agaciel.
PT no vermelho
Partido gasta muito com viagens e dívida de quase R$ 40 milhões torna-se impagável
Se alguém vir um dirigente do PT falando rápido ao celular para encurtar a conversa, não estranhe. Desde o início do ano, o partido resolveu limitar em R$ 500 a cota mensal de telefone de seus principais comandantes.
Esse é apenas um dos esforços que o PT vem fazendo para equacionar uma dívida que, em maio, era de R$ 39,2 milhões, segundo o Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Mas já pode estar mais perto dos R$ 40 milhões. O valor é disparado o maior entre os partidos políticos.
O principal adversário do PT nas urnas, o PSDB, deve quase cinco vezes menos: R$ 9,4 milhões. A pouco mais de um ano das eleições presidenciais, a notícia não é nada boa para um partido que pretende eleger a ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, como sucessora do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, numa disputa que se anuncia acirradíssima, e trabalha para construir palanques nos Estados a fim de ampliar a bancada no Congresso.
Parte da cúpula do PT evita falar abertamente sobre o assunto, mas está preocupada. Para piorar, este ano o partido terá gastos adicionais com o processo de eleição interna para escolha dos novos dirigentes. No início de 2010, haverá a comemoração de seus 30 anos e a realização de seu congresso. "A dívida é uma preocupação para a futura direção do partido. Houve corte de despesas, mas não foi suficiente", admite o deputado José Eduardo Cardozo (PT-SP), secretário- geral do partido e pré-candidato à presidência do PT.
Com expressivo aumento da receita proveniente do fundo partidário, da contribuição de filiados e de empresas, a expectativa era de que o PT hoje já conseguisse arrecadar mais do que gasta. Mas não é o que ocorre. "Nossa meta é terminar 2009 com uma situação de normalidade financeira. Infelizmente, hoje nós gastamos mais do que arrecadamos", lamenta o tesoureiro petista Paulo Ferreira. As despesas anuais são consideradas elevadas: somam R$ 93,9 milhões. As eleições municipais contribuíram para aprofundar o rombo.
Mesmo com débitos das campanhas de 2004 e 2006, o PT gastou em 2008 R$ 30,5 milhões para ajudar candidatos com seminários, confecção de material publicitário para os diretórios e contratação de produtora de vídeo. Só os adesivos com o slogan "Lula é PT" distribuídos para candidatos em todo o País custaram R$ 4,5 milhões. Na tentativa de aliviar o impacto sobre os combalidos cofres petistas, Ferreira já tomou outras medidas consideradas impopulares, que incluem a limitação de gastos com viagens e a redução do número de eventos partidários.
A ousadia de Agaciel Maia como todo poderoso chefe da administração do Senado não teve limites. Os novos diretores do Senado descobriram que Agaciel mandou construir uma escada secreta, não prevista no projeto do arquiteto Oscar Niemeyer, entre o terceiro e segundo andares do Anexo I, a ala mais vip da Casa. Agaciel tinha acesso a escada em espiral por meio de uma porta no fundo de seu gabinete.
Por essa escada, Agaciel poderia descer os degraus sem que a sua ausência fosse notada pelos funcionários da Diretoria-Geral. E que o havia no andar de baixo? De acordo com servidores do Senado, havia uma espaçosa sala, decorada com sofás e tapetes vermelhos e um telão para exibição de vídeos, que era usada por Agaciel para encontros também secretos. Um dos vídeos mostrados no telão de Agaciel, segundo servidores do Senado, tinha um título sugestivo: tardes molhadas. Uma providencial reforma, concluída há 20 dias, transformou o local em um gabinete para o senador João Claudino (PTB-PI), 2.o Secretário do Senado.
ÉPOCA tentou ouvir Agaciel sobre a finalidade da misteriosa escada. Ele recebeu os recados, mas não retornou as ligações. Mandou dizer que estava em reunião com seu advogado. Até esta semana, Agaciel estava convencido de que escaparia incólume de todas as denúncias contra ele. Após a notícia de que será investigado pela Polícia Federal por ter empregado de maneira clandestina a filha de um de seus principais assessores, ele mudou de opinião. Isolou-se em sua mansão, onde ele está se sentindo abandonado por aliados políticos e perseguido pelos novos diretores do Senado. O risco, temido por boa parte dos mais influentes senadores, é que Agaciel se torne um homem-bomba e abra o seu arquivo com revelações sobre alguns dos políticos mais importantes do país.
O pouco conhecido verbo acoelhar entrou para o vocabulário dos brasileiros na semana que passou, ao ser pronunciado, da tribuna, pelo senador Arthur Virgílio, do PSDB do Amazonas. Acoelhar-se quer dizer intimidar-se, amedrontar-se. Segundo o tucano, era assim que se encontravam alguns de seus colegas, os ditos “éticos” da Casa, diante das denúncias que proliferam na imprensa desde que o senador José Sarney assumiu a presidência, em fevereiro.
Citando textualmente o pedetista Cristovam Buarque, o petista Eduardo Suplicy e o peemedebista Pedro Simon, Virgílio disse que estes estariam acoelhados diante de supostas chantagens feitas pelo ex-diretor-geral do Senado Agaciel Maia, estopim da crise, e prepostos seus.
O suposto temor de Buarque, Suplicy e Simon – também pode-se incluir na lista Jarbas Vasconcelos, Tasso Jereissati e Tião Viana, o oponente de Sarney na disputa pela presidência, entre outros –, e que teria causado seu relativo silêncio diante das denúncias, estaria relacionado a ameaças de divulgação do uso de vantagens parlamentares em benefício próprio.
Ou seja, os senadores teriam preferido ficar na moita por medo de ver-se jogados na vala comum dos políticos que fazem mau uso das verbas públicas, prejudicando talvez irremediavelmente o discurso probo que sempre lhes serviu de catapulta eleitoral.
A nova guerrilha
Na quinta-feira 18, sob um calor de quase 40 graus, uma multidão de agricultores, familiares e curiosos se aglomerou em volta de um palanque montado na praça principal de São Domingos do Araguaia, no Pará, para ouvir um raro discurso de reparação pública do Estado. Ao microfone, o presidente da Comissão de Anistia do Ministério da Justiça, Paulo Abrão, de 2 metros de altura, metido em um paletó preto e empapado de suor, anunciou a indenização de 44 camponeses torturados pelo Exército entre 1972 e 1975, quando se instalou na região uma guerrilha para combater a ditadura. Estava ao lado do ministro da Justiça, Tarso Genro, e da governadora do Pará, Ana Júlia Carepa, ambos do PT. Mas foi ao PCdoB que ele agradeceu. “Institucionalmente, o PCdoB é o partido que mais tem auxiliado o governo neste processo”, afirmou Abrão.
Desde 2005, quando a Comissão de Anistia lançou-se em caravanas para levar ao Araguaia a possibilidade de reparação e indenização dos camponeses barbarizados pela ditadura, foi o Partido Comunista do Brasil, diante de um silêncio quase absoluto do PT, que se colocou à frente do processo. Por muitas razões. A mais óbvia delas: foram militantes da legenda que, no fim dos anos 60, conceberam o movimento guerrilheiro na selva amazônica. A certa altura, 69 combatentes chegaram a enfrentar mais de 5 mil soldados do Exército.
Os ruralistas riem por último
Acossado pelos deputados da bancada ruralista, o ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, voltou a pedir desculpas por ter chamado os grandes produtores rurais de “vigaristas”, durante uma manifestação na Esplanada dos Ministérios, no fim de maio. Convocado para dar explicações na Comissão de Agricultura da Câmara, o ministro admitiu que a palavra era “descabida”.
Não é a primeira vez que Minc pede desculpas. Mas os ruralistas não perderam a oportunidade de usar o episódio para atacá-lo ferozmente e voltaram a querer sua cabeça. “Que vergonha. O senhor deveria sair daqui e pedir demissão”, exasperou-se o deputado Giovanni Queiroz (PDT-PA). Na sequência, foi a vez de Márcio Junqueira (DEM-RR) dar sua alfinetada: “Se ficar, sugiro uma viagem à Amazônia, à Amazônia que o senhor não conhece”.
Para completar o bombardeio, o deputado Ronaldo Caiado (DEM-GO) apelou para as insinuações de que o ministro teria ligações com o tráfico de drogas. “O senhor se sentiria confortável se eu dissesse que nós, produtores rurais, defendemos a produção de arroz, milho, soja, carne, enquanto o senhor defende plantação de cocaína e maconha?”, afirmou. Em maio, o parlamentar já havia feito acusações semelhantes: “Ele (Minc) tem ligação com o tráfico da Rocinha e do Morro do Borel, tanto para se manter financeiramente quanto para o consumo”.
Diante dos ataques, Minc rebateu apenas a fala de Caiado. “Refuto as afirmações. São falsas, injuriosas.” Por trás do bate-boca, está a queda de braço travada entre ruralistas e ambientalistas no debate sobre as propostas de flexibilização da legislação ambiental.
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